Dionne
carregar no corpo uma porta,
sabendo da impossibilidade
de atravessá-la, encarar
o batente as dobradiças
fechadura, a madeira
e sua textura, o peso nas carnes
ao encarar o espelho sem nunca
ter visto o mar
do Castelo de São Jorge
carregar a aspereza no atrito
da pele com o mundo, farpas
na língua e a certeza de que
essa madeira não presta
de tábua de salvação, talvez
alimente uma fogueira, mas
levaríamos sem querer as cinzas
nas pálpebras pois fomos trazidas
à soleira, ouvimos o não
reverberar eras inteiras
transformamos o eco em canto
e conversamos com nossos mortos
desviar da porta implacável
conhecê-la do vão às lascas
fazer dela a referência que orienta
a fuga, agora, não olha
desmontar em si a porta
e se tornar seu avesso
ler o mundo com as palmas
das mãos criar sentidos nas solas
e com os pés alcançar um percurso
que não é destino
mas todo travessia
Stephanie Borges /junho de 2023